Artigos

A FISIOTERAPIA NA ASSISTÊNCIA A PORTADORES DE HEMOFILIA
Karina Gramani Say
Renata Neves Granito
Karina Nogueira Zambone Pinto
Ana Claúdia Muniz Rennó
Departamento de Fisioterapia – Universidade Federal de São Carlos / UFSCar – SP
  • RESUMO
A hemofilia é um grave distúrbio hereditário de coagulação sangüínea que provoca comprometimentos músculoesqueléticos
como limitações de movimentos articulares, hemartrose, hemorragias tissulares, aderências articulares
fibróticas, alterações de marcha, assimetria de forças musculares, contraturas e artrite hemofílica; afetando assim, a vida dos
indivíduos hemofílicos. Apesar da debilidade do aparelho locomotor não oferecer risco de vida, as seqüelas que
permanecem constituem sério fator incapacitante para o hemofílico. A Fisioterapia é capaz de auxiliar o tratamento desses
indivíduos, prevenindo as complicações da doença e possibilitando uma menor administração de reposição dos fatores
sangüíneos, o que proporciona uma melhor qualidade de vida e funcionalidade aos hemofílicos.
PALAVRA-CHAVE: hemofilia, hemartroses, artropatia, hemorragias, fisioterapia
  • INTRODUÇÃO
A Hemofilia é um distúrbio de coagulação sangüínea geneticamente determinado, sendo três tipos mais
freqüentes dessas coagulopatias, a hemofilia tipo A, B e a doença de Von Willebrand (RODRÍGUEZMERCHÁN,
1997), emboras as outras deficiências de coagulação hereditárias menos freqüentes possam, às
vezes, apresentar quadro hemorrágico severo.
Historicamente, a mortalidade dos portadores de hemofilia e outros distúrbios congênitos de coagulação
era devida à hemorragia incontrolada associada à severa deficiência de fatores de coagulação VII e IX
(DIAMONDSTONE; ALEDORT; GOEDERT, 2002).
Sem a intervenção médica através da reposição dos fatores de coagulação e o acompanhamento
fisioterapêutico preventivo, com a finalidade de se evitar incapacidade funcional e proporcionar melhor
qualidade de vida para esses indivíduos, torna-se muito difícil evitar as complicações músculo-esqueléticas dessa
moléstia que inclui limitações de movimentos articulares, hemartrose, hemorragias tissulares, aderências
articulares fibróticas, alterações de marcha, assimetria de forças musculares, contraturas e artrite hemofílica;
alterando a vida dos indivíduos hemofílicos. As hemartroses agudas são os tipos mais freqüentes de derrame no paciente com hemofilia. (RIBBANS; GIANGRANDE; BEETON, 1997).
Por sua determinação genética, os episódios de hemorragias iniciam-se precocemente na vida das
crianças, assim sendo, Rodríguez-Merchán (1997) defende uma profilaxia contínua entre 2 a 18 anos para a
redução da incidência de sinovite hemofílica crônica e prejuízos articulares, que permanecem como as principais causas de incapacidade para o paciente hemofílico.
A protelação e/ou um tratamento inadequado podem gerar uma série de alterações patológicas dentro da
articulação, levando a artropatia dolorosa (RIBBANS; GIANGRANDE; BEETON, 1997).
Rev. biociênc.,Taubaté, v.9, n.1, p.37-45, jan-mar 2003.
O cuidado com o paciente hemofílico envolve uma equipe conduzida pelo médico hematologista, mas
também inclui a atuação de um ortopedista e um fisioterapeuta, pois ótimos resultados têm sido obtidos pela
combinação do fator de reposição, repouso e reabilitação supervisionada associada à crioterapia (RIBBANS; GINAGRANDE; BEETON, 1997). A hemofilia é uma doença cara, pois seu tratamento é extremamente
dependente de fatores de reposição para a coagulação (ROGOFF et al., 2002). Porém, a introdução do tratamento
com plasma derivado do fator VIII (FVIII) humano tem proporcionado aos pacientes com hemofilia A uma
qualidade e expectativa de vida similar à da população em geral (SUITER, 2002).
É conhecido que os níveis de fator VIII (hemofilia A) aumentam com o stress, exercício físico, uso de
epinefrina e na gravidez (MARINHO, 1985). Os benefícios de uma musculatura forte para proteção das
articulações foram descritos por Boone (1966) e em 1974, a mesma autora descreveu que programas de
exercícios constantes preveniam e reduziam as hemorragias intra-articulares.
Não há uma incidência verdadeira conhecida, porém estima-se que nos EUA aproximadamente, 8 a 11
em 100.000 da população sejam portadores de hemofilia (RODRÍGUEZ-MERCHÁN, 1997), a maioria no sexo masculino.
No Brasil, também não há uma estimativa abrangente sobre a verdadeira incidência da hemofilia, mas
sabe-se que há numerosos casos nos serviços públicos e é necessário especializar o acompanhamento
fisioterapêutico a esse tipo de paciente. Para isso, é fundamental o estudo dessa doença e suas respostas ao
tratamento por meios físicos.
Dentro desse contexto, o objetivo deste trabalho é elucidar o papel do fisioterapeuta na hemofilia, visto
que a fisioterapia dispõe de vários agentes físicos que podem ser aplicados de acordo com a fase da doença.
Apenas apresentaremos uma hipótese dos recursos que podem ser usados em cada fase que o hemofílico se
encontrar.
  • A HEMOFILIA
A hemofilia A é a mais freqüente das coagulopatias, incide em 85% dos casos, sendo uma deficiência do
fator VIII, já a hemofilia do tipo B tem incidência em 15% dos casos, com deficiência do fator IX (fatores do
sistema intrínseco de coagulação).
Essa deficiência recessiva ligada ao sexo (cromossoma X) causa grande modificação no mecanismo de
coagulação. É reconhecido que os hemofílicos possuem níveis de fator VIII ou IX reduzidos quando comparados
a níveis existentes em mulheres normais portadoras, mas são raras as portadoras que manifestam alguma
tendência hemorrágica. O grau de severidade dessa doença é proporcional à deficiência da atividade coagulante
do fator VIII ou IX.
As hemofilias, independente de serem do tipo A ou B, podem ser classificadas quanto ao seu nível de
deficiência dos respectivos fatores de coagulação em nível leve, moderado e severo (MARINHO, 1985;
LORENZI,1992; RODRÍGUEZ-MERCHÁN, 1997). Em geral, os membros de uma família de hemofílicos têm
sempre o mesmo tipo de hemofilia e com gravidade semelhante.
Na hemofilia do nível grave, o nível fator VIII ou IX é menor que 1% do normal, com o tempo de
coagulação em torno de 60 minutos e os sintomas hemorrágicos graves, muitas vezes espontâneos e
incapacitantes (LORENZI, 1992; RODRÍGUEZ-MERCHÁN, 1997). O paciente com hemofilia severa pode ter
vários episódios hemorrágicos por mês, espontaneamente ou com mínimo trauma, ou mesmo com as atividades
da vida diária. O nível crítico de fator necessário para manter a hemostase, em caso cirúrgico ou traumático, é
de 30% (RODRÍGUEZ-MERCHÁN, 1997).
Na hemofilia moderada, os níveis de fator VIII ou fator IX oscilam entre 1 e 5% do normal e o tempo de
coagulação ao redor de 30 minutos e os sintomas também são graves, porém não tão acentuados como no nível
grave. Neste nível, o paciente pode ter hemorragias várias vezes no ano, mas pode haver longos períodos sem
nenhum episódio hemorrágico (RODRÍGUEZ-MERCHÁN, 1997).
Na hemofilia leve, os níveis variam entre 5 e 25% de fator do normal, com o detalhe que o tempo de
coagulação pode estar entre o normal ou levemente aumentado. Nesse nível, o fenômeno hemorrágico
espontâneo é raro, principalmente com hemartroses. Só se nota importantes hemorragias em casos traumáticos e
cirúrgicos.
Em 1892, Konig (apud BUZZARD, 1997) estabeleceu a relação entre hemofilia e hemartrose. E apesar
do envolvimento do aparelho locomotor não apresentar risco de vida ao indivíduo, as seqüelas podem ser muito
incapacitantes para a vida do hemofílico. A porcentagem das articulações acometidas é de 44% joelho, 25%
cotovelo, 14% tornozelo, 8% ombro, 5% quadril e os 4% restantes incluem pequenas articulações do corpo.
O joelho é a articulação mais envolvida, isto se deve ao maior suporte de carga ou solicitação dessa
articulação, que leva a um derrame sangüíneo que irá distender e pressionar a cápsula articular, causando dor e
uma resposta inflamatória da membrana sinovial, além da adoção de uma postura antálgica com espasmo
muscular associado. As reincidências da hemartrose determinarão a cronicidade desse quadro, com
espessamento sinovial, fibrose dos tecidos, destruição e remodelação progressiva da cartilagem e dos ossos,
associada à instabilidade osteoligamentar que irá favorecer a ocorrência de luxações, subluxações e calcificação
de tecidos moles. Após os 30 anos de idade, 90% das articulações do joelho em pacientes hemofílicos
apresentam destruição severa (EICKHOFF et al, 1997).
Além do comprometimento articular, a hemofilia determina ainda seqüelas musculares. Traumas
mínimos podem resultar em grandes hematomas intramusculares (EILERT et al., 1993), que levam a grupos
musculares tensos ou dolorosos desencadeando possíveis compressões de nervos periféricos (MARIE GAL;
NAGATA, 1985).
Embora a hemofilia não represente um risco de vida estatisticamente significativo, ela é considerada
uma doença grave devido às complicações músculo-articulares já citadas (MARIE GAL & NAGATA; 1985).
Com isso, verifica-se a importância da fisioterapia no tratamento interdisciplinar do indivíduo hemofílico
(BATTISTELLA, et al, 1985).
  •                          QUADRO CLÍNICO DA HEMOFILIA: AS COMPLICAÇÕES
O quadro clínico da hemofilia mostra que o sucesso do tratamento é a prevenção de hemorragias
associando o tratamento precoce de reposição e a fisioterapia como parte dos cuidados integrais ao indivíduo
hemofílico. Somente o conjunto desses dois acompanhamentos pode reduzir a incidência de artropatias
hemofílicas.
A hemartrose é o elemento clínico mais característico da hemofilia. Esses derrames articulares são
sempre provocados por microtraumas e são mais freqüentemente notados nas grandes articulações, apenas nos
casos mais graves da doença ocorrem hemorragias espontâneas.
A fase aguda da hemartrose evolui com fenômenos inflamatórios correspondentes a comprometimentos
intra-articulares (Figura 1). A reabsorção do sangue é feita, com exceção do ferro hemoglobínico, que se fixa ao
nível da cartilagem sinovial e tecidos periarticulares sob a forma de ferritina, responsável pela inflamação
crônica. As lesões sinoviais na artropatia hemofílica, denominada de sinovite hemofílica, evoluem desde uma
hipertrofia inicial com depósitos pigmentares, passando por um estado de hiperplasia angiomatosa e, finalmente,
uma fibrose, tornando mais agudos e freqüentes os acidentes hemorrágicos e reduzindo a função articular. A
sinóvia mostra focos de formação de vilosidades precocemente, cerca de 4 dias após o dano à articulação.
As lesões articulares podem evoluir na hemofilia desde uma osteoporose e irregularidade de superfície
óssea até uma fase mais adiantada que pode determinar uma destruição articular com comprometimento grave
para o paciente (MARINHO, 1985, LORENZI, 1992), pois a sinovite hemofílica causa hipertrofia das placas de
crescimento epifisais e o excesso de crescimento dessa placa leva a problemas ósseos no paciente jovem, tais
como discrepância do comprimento da perna, deformidades angulares e alterações de contorno no
desenvolvimento do esqueleto. A osteoporose desenvolve-se como resultado do desuso e imobilização articular
(RODRÍGUEZ-MERCHÁN, 1997). A sinóvia anormal atuará de maneira similar a uma fístula artério-venosa,
produzindo um excessivo suporte sangüíneo para a área das placas epifisárias, estimulando as placas de
crescimento.
Na hemartrose aguda, a dor geralmente responde rapidamente à administração apropriada dos fatores
concentrados, mas a resolução do derrame e restauração da movimentação depende da quantidade de sangue na
articulação (RODRÍGUEZ-MERCHÁN, 1997), e é justamente nessa questão que a fisioterapia pode atuar.
Nessa fase aguda, a articulação envolvida é contida em flexão, numa posição de proteção, pois a
movimentação ativa e passiva é dolorosa e muito restrita (RODRÍGUEZ-MERCHÁN, 1997).

Depois de vários episódios de derrames intra-articulares seguidos de sinovites pode-se chegar a um ciclo
de hemartroses-sinovites-hemartroses (RODRÍGUEZ-MERCHÁN,1997).


_
A fase subaguda é dedicada para uso dos agentes físicos a fim de diminuir o tempo de resolução do hematoma ou hemorragia e também o consumo de medicamento.
As repetidas hemartroses e imobilizações no hemofílico levam rapidamente a atrofias musculares
importantes. Os músculos, diretamente ou por intermédio dos tendões, representam proteção para a articulação.
A hemorragia muscular é a segunda maior complicação dessa moléstia, ocorrendo geralmente no compartimento
anterior do antebraço, panturrilha e ilío-psoas, tendo como principais manifestações clínicas às observadas na
Figura 2, como dor, aumento de volume e a incapacidade funcional que coloca as articulações movidas por esses
músculos em posição de proteção.
As lesões nervosas têm caráter transitório e estão ligadas as compressões nervosas. Há também
hemorragias subcutâneas e teciduais, observadas freqüentemente nos indivíduos com hemofilia moderada ou
grave, não somente em traumas pequenos, mas sem razão conhecida. Essas hemorragias podem assumir grandes
proporções pelo fato do sangue não coagular nos hematomas, facilitando a difusão através dos tecidos e fáscias.
Essas hemorragias não somente levam à perda de sangue com quadro de anemia hemorrágica mas, também a
uma série de efeitos colaterais devido à pressão e manifestação dolorosa exercida. (LORENZI, 1992).
Pode ocorrer deficiência do fluxo sangüíneo nas áreas comprometidas ou mesmo lesões nervosas com
conseqüente paresia, contratura ou redução da sensibilidade muitas vezes observadas em comprometimento do
nervo ciático e do nervo cubital. Essas hemorragias teciduais podem resultar em perfuração da pele, acrescidas
de complicações infecciosas e fístulas. Com esse quadro é necessária a administração substitutiva de
concentrados para parar a hemorragia e diminuir a dor e possibilitar a reabsorção do sangue.
Atenção especial deve ser dada à hemorragia tissular profunda do músculo ilío-psoas, pelo risco de
evolução para cistos ou pseudotumores que podem levar à compressão e destruição muscular e se não forem
removidas cirurgicamente tendem a recidivar. Devido ao tipo de vascularização que esses cistos apresentam, são
extremamente difíceis de serem removidos. O aparecimento desses pseudotumores complica ainda mais o caso,
já que toda intervenção cirúrgica em um hemofílico exige grande cuidado.




  •  TRATAMENTO
O tratamento precoce é necessário para evitar as complicações da doença. O progresso contínuo do
prejuízo articular depois das hemartroses, potencialmente levam a sinovites crônicas, artropatia destrutiva e
geralmente à dor.
Raramente realiza-se, ainda na atualidade, procedimento cirúrgico para o tratamento das artropatias
hemofílicas severas, mesmo os de baixo risco como a artroscopia. Recomenda-se que esses procedimentos sejam
realizados em centros especializados ao atendimento do indivíduo hemofílico (EICKHOFF et al., 1997). Essa
recomendação torna ainda mais importante o tratamento preventivo para os casos de hemofilia, somando-se com
o dados de grande risco de fracasso obtido nas artroplastias totais de joelho em hemofílicos, que devido ao
freqüente desenvolvimento de artropatia dessa articulação necessitam da colocação de prótese articular numa idade muito jovem (NORIAN et al., 2002).
O tratamento conservador com base na reposição de fatores de coagulação é o mais utilizado, apesar de
não representar a cura para o indivíduo hemofílico, possibilita o controle de episódios hemorrágicos. Sobretudo, progresso significante tem sido feito recentemente na terapia genética para a hemofilia (VANDENDRIESSCHE; COLLEN; CHUAH, 2001).
Em 2000, realizou-se o primeiro tratamento com sucesso através da terapia genética para indivíduos
hemofílicos (HERZOG; HAGSTROM, 2001), porém ainda tem alto custo e não tem abrangência significativa
para os portadores dessa coagulopatia, entretanto a transferência genética tornou-se uma potencial e importante possibilidade de
tratamento para a hemofilia, ainda em experimentação (MONAHAN; WHITE II, 2002).
  • ATUAÇÃO DA FISIOTERAPIA
Para o estabelecimento de um plano de tratamento adequado, é necessária uma avaliação fisioterapêutica
que inclua entrevista, exame físico e exames de provas funcionais. Na entrevista deverão ser coletados dados a
respeito do paciente, dos seus hábitos de vida, sua história pregressa e a história da moléstia atual. O exame
físico deve constar de goniometria, perimetria articular, perimetria muscular, provas de função muscular, análise
da postura e da coluna vertebral e um exame de comprimento dos membros inferiores (uma vez que os
sangramentos repetidos na articulação do joelho provocam estímulos dos centros de crescimento da superfície
óssea articular), além de investigação de comprometimentos respiratórios e presença de dor. Também são
importantes os exames de provas funcionais, como a análise da marcha (em superfície plana e inclinada), do
equilíbrio estático e dinâmico e um teste de resistência, que consiste na prova dos exercícios que integrarão o
esquema terapêutico definitivo (RIBEIRO; SOARES, 1986).
A partir da avaliação inicial deverá ser definido um plano de tratamento fisioterapêutico,
necessariamente individualizado, considerando a fase do processo hemorrágico, a intensidade da hemorragia, a
dor, a idade do indivíduo e o grau de lesão. Em linhas gerais, os objetivos do tratamento serão o controle da dor,
a prevenção de deformidades, a prevenção de complicações respiratórias ou vasculares no paciente acamado, a
recuperação da capacidade funcional de um músculo ou de uma articulação, a manutenção de um equilíbrio
estático e dinâmico do sistema músculo-esquelético, o estímulo à participação da família e a reintegração do
indivíduo no seu meio social e profissional (MARIE GAL; NAGATA, 1985).
  • TERAPIA PROPOSTA
Preventiva
Um programa preventivo deve incluir cinesioterapia progressiva, incentivo à prática de esportes com
baixo impacto, principalmente a natação e orientação quanto aos cuidados necessários para evitar as hemorragias
(BATTISTELLA et al., 1985). Cabe ainda ao fisioterapeuta esclarecer os familiares a respeito desta moléstia a
fim de que possam contribuir de maneira correta no tratamento e evitem comportamentos superprotetores
(BATTISTELLA et al., 1985). Deve-se ensinar também aos pais que não puxem o bebê pelos membros
superiores para evitar lesões e hemorragias logo nessa primeira fase da vida.
Fase aguda das Hemorragias
· Imobilização: No caso de sangramento articular, imobilizar em goteira de gesso ou de material
termoplástico, como o polipropileno, por no máximo quatro dias. Este procedimento é utilizado para o alivio da
dor e para a prevenção de deformidades (BATTISTELLA et al., 1985; RIBEIRO; SOARES, 1986; MARIE
GAL; NAGATA, 1985).
· Nos hematomas musculares, a imobilização do músculo comprometido deve ser feita através de repouso
(MARIE GAL; NAGATA, 1985). No entanto, devido à atrofia muscular gerada, a imobilização deve ser
mantida por curtos períodos e somente quando absolutamente necessária, sempre incentivando a realização de
contrações isométricas (BATTISTELLA et al.,1985).
· Uso de órteses, com o intuito de preservar o segmento afetado (MARIE GAL; NAGATA, 1985).
Algumas vezes, ao invés da goteira gessada, podem ser utilizados suportes para deambulação, com o intuito de
evitar sobrecarga na articulação (BATTISTELLA et al., 1985)
· Crioterapia: São utilizados, mesmo durante a imobilização, aplicações de gelo, gel ou gases refrigerantes
na forma de spray, durante 20 minutos (ANDREWS, 2000). É indicada para diminuir a dor, através da redução
da atividade dos receptores sensitivos da condução nervosa e da excitabilidade das fibras A delta; para auxiliar
na contenção das hemorragias, através da lentificação dos processos metabólicos e da proteólise e também para
obtenção de relaxamento muscular, através da diminuição da atividade do sistema músculo-fusal responsável
pela manutenção do tônus.
· Eletroterapia: Pode ser utilizada para a reabsorção do hematoma, para analgesia ou para estímulo trófico
(MARIE GAL; NAGATA, 1985). As correntes contínuas poderão ser utilizadas para realização de iontoforese
com a finalidade da reabsorção do hematoma. Devido a sua ação repulsiva, contra-irritativa e vasodilatadora, o
bicloridrato de histamina a 1/10.000 é comumente utilizado. No entanto, em muitos casos a histamina é irritativa
para a pele. Nestes casos, a simples galvanização é suficiente, uma vez que as propriedades eletroforéticas da
corrente representam o maior benefício da iontoforese (MARIE GAL; NAGATA, 1985). As correntes
diadinâmicas e as interferenciais também aceleram a reabsorção de fluidos, além de manter o trofismo muscular.
· Cinesioterapia: Deve ser instituída precocemente, respeitando a dor do paciente (BATTISTELLA et al.,
1985). Na fase aguda, deverão ser empregadas contrações isométricas. Tais exercícios são importantes por não
provocarem dor, enquanto mantêm e desenvolvem força muscular (RIBEIRO; SOARES, 1986; MARIE GAL;
NAGATA, 1985). Deverão ser trabalhados os músculos ligados diretamente à articulação comprometida e todos
aqueles que fornecem equilíbrio dinâmico e estático de finalidade funcional (MARIEGAL; NAGATA, 1985). É
importante o cuidado com a mobilização passiva, que deve até ser evitada para não agravar as lesões.
· É importante lembrar que o repouso do segmento acometido é de vital importância na fase aguda; assim,
maiores esforços ou sobrecarga sobre a região afetada devem ser evitados (RIBEIRO; SOARES, 1986).
· Emprego de Ultra-Som, no caso de fibrose (MARIE GAL; NAGATA, 1985).
· Tratamento Postural: Posturas adequadas devem ser mantidas no leito e fora dele (RIBEIRO; SOARES,
1986; MARIE GAL; NAGATA, 1985).
· Nas atividades de vida diária devem ser utilizados, sempre que necessário, dispositivos de apoio
(RIBEIRO; SOARES, 1986).
  • Fase Crônica
· Calor: Os efeitos fisiológicos a serem obtidos com a termoterapia de adição é a vasodilatação, a
liberação de substâncias vasoativas e o relaxamento do espasmo muscular. Calor superficial ou calor profundo
podem ser utilizados para facilitar a mobilização articular e aliviar a dor (MARIE GAL; NAGATA,
1985).Cinesioterapia: Os exercícios terapêuticos visando a funcionalidade, a manutenção e o fortalecimento da
musculatura, o restabelecimento e a manutenção da amplitude de movimento articular, o relaxamento, o reforço
do esquema corporal, a coordenação, o equilíbrio, a orientação postural, e a prevenção de complicações
respiratórias e vasculares (MARIE GAL; NAGATA, 1985). A cinesioterapia deve ser, necessariamente,
progressiva, iniciando com mobilizações ativas assistidas, como por exemplo, mediante o uso de splints ou
molas (suspensoterapia) (RIBEIRO; SOARES, 1986). Na seqüência, devem ser orientados os exercícios ativos
livres contra a gravidade, oferecendo como resistência ao movimento apenas o peso do segmento corporal a ser
trabalhado. Posteriormente, deve ocorrer incremento progressivo na resistência, manualmente ou através de
pesos. Assim, com o progredir do quadro clínico do paciente, pode-se fazer uso da bicicleta ergométrica, de
outros dispositivos de mecanoterapia ou de técnicas manuais, como o Kabat (RIBEIRO; SOARES 1986;
MARIE GAL; NAGATA, 1985).No entanto, os exercícios isotônicos contra-resistidos são parcialmente contraindicados
para pacientes com hemofilia, devido ao risco de aparecimento precoce de artrose fêmoro-patelar
nesses pacientes. Restrição semelhante deve ser feita aos exercícios passivos, devido ao risco de desencadearem
hemorragias articulares e/ou musculares (BATTISTELLA et al., 1985).
· Hidroterapia: A hidroterapia fornece uma proteção ao sistema músculo-esquelético e permite a retomada
da cinesioterapia e da marcha desde a fase subaguda. Além disso, com o avançar do tratamento, a água pode ser
usada para empregar resistência aos exercícios na fase crônica (RIBEIRO; SOARES, 1986; MARIE GAL;
NAGATA, 1985).
· Eletroterapia: Pode ser usada para recuperar o déficit neuromuscular depois de uma neuropatia por
compressão (RIBEIRO; SOARES, 1986).
· Crioterapia: Pode ser usada como medida profilática quando ao fim dos exercícios verifica-se um
aumento da temperatura na região. No entanto, a crioterapia é pouco utilizada na fase crônica. (RIBEIRO;
SOARES, 1986).
Orientação Postural: Deve haver uma adequada orientação para que seja adotada uma postura correta nas
atividades de vida diária (RIBEIRO; SOARES, 1986).
  • RESULTADOS
Diante do exposto, os pacientes que se submetem ao tratamento fisioterapêutico adequado precoce
evoluem satisfatoriamente, com controle do derrame intra-articular, alívio da dor, manutenção da capacidade
funcional das articulações, prevenindo assim deformidades articulares, de acordo com as evoluções dos
pacientes hemofílicos que foram observadas.
  • CONCLUSÃO
Por meio deste trabalho, nota-se que o tratamento fisioterapêutico para o hemofílico é importante à
medida que previne e reduz as complicações dessas patologias. Assim, sugerimos um tratamento individualizado
precoce para prevenir as complicações como artropatias hemofílicas, as quais se tornam extremamente
incapacitantes com a evolução dessa doença hereditária.
  • ABSTRACT
The hemophilia is a serious hereditary lifelong bleeding disorder that causes injuries in muscle and bone systems
such as limitations of articular movements, hemarthroses, hemorrhage tissue, ad art fib, alterations in the gait,
asymmetric of muscles forces, contracture and arthris hemophilic, affecting the life of the hemophilic patients.
Although, the alterations in the gait do not represent risk of life, they cause a lot of limitations to hemophilic
people. Physiotherapy can help these patients, preventing complications and reducing the administration of
bleeding factors, improving the quality of life and the functionality to the hemophilics.
KEY-WORDs: hemophilia, hemarthroses, arthropathy, hemorrhage, and physiotherapy.
  • REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
ANDREWS, J. R et al. Reabilitação física das lesões desportivas. 2. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan.
2000. p. 11-14.
BATTISTELLA, l. R. et al. Medicina de Reabilitação e hemofilia - imperativos. Boletim, v. VII, n. 136, 1985.
BOONE, D. C. Physical therapy aspects related to orthopedic and neurologic residual of bleeding. Phys. Ther. n.
42, p. 1272-1281, 1996.
BOONE, D. C. Management of musculo-skeletal problems in haemophilia. Phys. Ther. n. 54, p. 122-127, 1974.
BUZZARD, B. M. Physiotherapy for prevention and treatment of chronic hemophilic synovitis. Clinical
Orthopedics and related Research. n. 343, p. 42-46, 1997.
DIAMONDSTONE, L. S; ALEDORT, L. M; GOEDERT, J. J. Factors predictive of death among HIVuninfected
persons with haemophilia and the other congenital coagulation. Haemophilia., v. 8, n. 5, p.660-667,
2002.
EICKHOFF, H. H. et al. Arthroscopy for Chronic Hemophilic Synovitis of the Knee. Clinical Orthopaedics and
Related Research, n. 343, p. 58-62, 1997.
EILERT, C. B. et al. Elaboração de uma proposta de tratamento fisioterápico para pacientes portadores de artrite
hemofílica. Revista fisioterapia em movimento. v. VI, n. 1, 1993.
HERZOG, R. W; HAGSTROM, J. N. Gene therapy for hereditary hematological disords. Am. J.
Pharmacogenomics, v. 1, n. 2, p. 137-144, 2001.
LORENZI, T. F. Manual de Hematologia. Rio de Janeiro: Medsi. 1992.
MARIE GAL, P. L.; NAGATTA, A.Y. Medicina Física no tratamento das seqüelas músculo-articulares da
hemofilia - bases fisiológicas do uso de agentes físicos. Boletim. v. VII, n. 136, 1985.
MARINHO, H. M. Hematologia. São Paulo: Sarvier, 1985. p. 253-94
MONAHAN, P. E.; WHITE II, G. C. Hemophilia gene therapy: update. Curr. Opin. Hematology., v. 9, n. 5, p.
430-436, 2002.
NORIAN, J. M. et al. Total Knee Arthroplasty in Hemophilic Arthroplasty. J. Bone Joint Surg. Am., v. 84-A, n.
7, p. 1138-1141, 2002.
RIBBANS, W. J.; GIANGRANDE, P.; BEETON, K. Conservative treatment of hemarthrosis for prevention of
hemophilic synovitis. Clinical Orthopedics and related research. n. 343, p. 12-18, 1997.
RIBEIRO, M. E. L; SOARES, B. R. A fisioterapia no paciente hemofílico institucionalizado. Boletim. v. VIII, n.
140, 1986.
RODRÍGUEZ-MERCHÁN, E. C. Pathogenesis, Early diagnosis, and Prophylaxis for chronic hemophilic
Synovitis. Clinical orthopedics and related research. n. 343, p. 6-11, 1997.
ROGOFF, E. G. et al. The upward spiral of drugs costs: a time series analysis of drugs used in the treatment of hemophilia. Thromb.
Haemost., v. 88, n. 4, p. 545-553, 2002.
SUITER, T. M. First and next generation native rFVIII in the treatment of hemophilia A. What
has been achieved? Can patients be switched safely? Semin. Thoromb. Hemost., v. 28, n. 3, p.
277-284, 2002.
VANDENDRIESSCHE, T; COLLEN, D; CHUAH, M. K. Viral vector-mediated gene therapy for
hemophilia. Curr. Gene therapy., v. 1, n. 3, p. 301-315, 2001.

Fonte: Artigo disponivel no Google No formato De Pdf